A CONSTITUIÇÃO POLÍTICA DA CONFEDERAÇÃO SUÍÇA


Este trabalho tem como finalidade apresentar a constituição política da Confederação Suíça, usando como base as descrições referentes ao Governo e ao Estado contidas na Constituição Federal, além dos valores e aspectos relevantes nesta apresentados.
 
1. Aspectos Gerais
 
A Suíça está situada na Europa Central, entre a cadeia montanhosa dos Alpes. O país faz fronteira com cinco países, sendo assim ao norte, com a Alemanha, a oeste, com a França, com a Itália ao sul e com a Áustria e Liechtenstein a leste. Apesar da localização, a Suíça não faz parte da União Européia.
 
A população suíça, aproximadamente 7.5 milhões de cidadãos, fala francês, alemão, romanche e italiano, sendo estas as línguas oficias. Costuma- se falar, também, o suíço, um dialeto da língua alemã.
 
2. Constituição Federal
 
Alemão: Die Bundesverfassung der Schweizerischen Eidgenossenschaft
Francês: Constitution Fédérale de la Confédération Suisse
Italiano: Costituzione Federale della Confederazione Svizzera
Romanche: Constituziun Federala da la Confederaziun Svizr

A Constituição atual da Suíça foi promulgada em 18 de abril de 1999 e entrou em vigor a partir de 1 de janeiro de 2000. Ela tem como raiz a Constituição de 12 de setembro de 1848, dia em que a Suíça passou de uma Confederação a uma Federação.
 
A Constituição suíça é composta por seis Títulos e um preâmbulo, o qual trata dos valores que motivaram a Assembléia Constituinte.
 
O Título primeiro, “Disposições Gerais”, contém determinações gerais do Estado, desde sua organização até seus valores e características específicas. É composto pelos seis primeiros artigos.
 
O Título segundo, “Direitos Fundamentais, Cidadania e Objetivos Sociais”, composto do artigo 7º ao 41º, descreve os direitos fundamentais dos cidadãos.
 
A distribuição dos poderes em Federação, cantões e municípios é regulada no Título terceiro “Confederação, Cantões e Municípios”, composto do artigo 43º ao 135º.
 
O Título quarto, “Povo e Cantões”, regula no artigo 136º ao 142º os direitos políticos do povo suíço e dos cantões.
 
A organização e a função das Autoridades Federais, da Assembléia Federal, da Administração Federal, do Conselho Federal e do Tribunal Federal são determinadas nos artigos de 143º ao 191º, dentro do Título quinto “Autoridades Federais”.
 
O Título sexto, “Revisão da Constituição Federal e de Disposições Transitórias”, prevê a possibilidade de revisão da Constituição suíça nos artigos 192º ao 197º. Para mudar a Constituição é preciso a maioria da aprovação do povo suíço e dos cantões.
 
3. O Estado Suíço
 
Palácio Federal da Suíça, em Berna
A Confederação Suíça é formada por vinte e seis estados, os chamados cantões, que são: Zurique, Berna, Lucerna, Uri, Schwyz, Obwalden e Nidwalden, Glaris, Zug, Friburgo, Soleure, Basileia-cidade e Basileia-região, Schaffhausen, Appenzell Ausserrhoden e Appenzell Innerrhoden, São Galo, Grisões, Argóvia, Turgóvia, Tessino, Vaud, Valais, Neuchâtel, Genebra e Jura.

Apesar de não haver uma capital oficial, a cidade de Berna é assim intitulada por ser a sede do Conselho Federal.
 
4. O Governo Suíço
 
Para entender a forma que o poder é exercido na Suíça, deve-se partir do princípio de que tal poder está dividido em três esferas [i]: o poder cantonal, que é soberano quanto às questões delegadas pela da Constituição Federal [ii], o poder municipal, submisso as leis do cantão, e o poder federal, responsável pelos assuntos internacionais e de interesse extra-cantonal. Tal poder federal parte do princípio de representatividade, caracterizando a Confederação Suíça como uma República Parlamentarista.
 
Sendo assim, existe um Conselho Federal, que ocupa o papel do Poder Executivo, além de um Parlamento bicameral, formado pelo Conselho Nacional e pelo Conselho dos Estados, exercendo o Poder Legislativo. Existe, ainda, um Tribunal Federal, representando o Poder Judiciário.
 
4.1. Conselho Federal
 
Na Suíça não há um representante único do Poder Executivo, mas sim um Conselho Federal formado por sete pessoas. Tais pessoas são eleitas pelo Parlamento a cada quatro anos, sem haver nenhum limite de mandato [iii].
 
Entretanto, há determinadas situações que requerem uma única pessoa para representar a Confederação, seja em nível internacional ou em pronunciamentos do Governo, até mesmo em casos de empate nas votações internas do Conselho. Por isso, a cada ano, o Conselho Federal elege um representante oficial, o que não implica em nenhuma questão hierárquica, já que cada membro do Conselho tem mais poder que o próprio representante.
 
4.2. O Parlamento
 
O Conselho Nacional é formado por duzentas pessoas, eleitas de quatro em quatro anos por um sistema de representatividade proporcional ao contingente populacional de cada cantão. Já o Conselho dos Estados é formado por quarenta e seis pessoas, sendo que cada cantão elege dois representantes e os semi-cantões, apenas um.
 
O sistema eleitoral é de competência de cada cantão, diferindo-se os métodos eleitorais entre eles.
 
A aprovação de uma lei depende de um consenso entre os dois Conselhos, havendo ainda medidas que solucionem possíveis divergências, como os referendos [iv].
 
4.2.1. Democracia Direta
 
Uma das características mais peculiares do Poder Legislativo suíço é o da consulta popular rotineira através de referendos, constituindo o conceito de democracia direta.
 
Seja em nível cantonal ou federal, é comum a consulta popular em assuntos que dizem respeito à população, como mudanças nas leis ou outro tipo de assunto interno. Mesmo havendo a representatividade através de um Parlamento eleito, este, quando não consegue chegar a um consenso em suas votações internas, permite que a população faça a escolha, sempre respeitando o princípio da representatividade proporcional ao contingente populacional de cada cantão.
 
A nível cantonal, os referendos são organizados pelo próprio cantão, mantendo sua soberania. Além disto, as medidas adotadas por um cantão através de referendos não precisam ser aplicadas aos outros cantões, desde que estas não violem os termos estabelecidos pela Constituição Federal.
 
Os referendos podem ser obrigatórios, quando dizem respeito a aprovar ou não medidas já adotadas pelo Parlamento, ou facultativos, quando se trata de uma iniciativa popular, respeitando o direito de livre iniciativa[v].
 
5. Relação Religião-Estado
 
O Estado suíço assegura a liberdade na escolha e no exercício da Religião. Cada cidadão ou residente no território suíço tem o direito de participar de organizações religiosas, tendo assim a livre escolha como base da adesão nesta comunidade[vi].
 
Entretanto, é de competência dos cantões definir sua própria religião oficial que, atualmente, divide-se entre o catolicismo, catolicismo suíço reformado e protestantismo. Tais definições só simbolizam a maioria do cantão, sem haver nenhum tipo de pressão para obrigar seguidores de outras denominações religiosas aderirem as crenças da maioria.
 
6. Valores do Estado
 
A maioria dos valores da Confederação Suíça é tratada ainda no preâmbulo da Constituição:
 
“O povo suíço e os cantões, conscientes de sua responsabilidade perante a criação, no esforço de reiterar a Confederação, para fortalecer a liberdade e a democracia, a independência e a paz, em solidariedade e sinceridade perante o mundo, no anseio de viver em unidade a sua pluralidade, com respeito mútuo e consideração, conscientes das conquistas comuns e da responsabilidade perante as gerações futuras, na certeza de que somente é livre aquele que faz uso de sua liberdade e que a força do povo se mede no bem-estar dos fracos”.
 
Nota-se, portanto, a preocupação em tentar fazer uma Constituição que atenda às necessidades de cada cantão, respeitando suas diferenças, sem perder a concepção de Estado, mas garantindo igualdade entre a sociedade. Percebem-se, também, reflexões a respeito da responsabilidade social dos suíços perante o mundo, as quais se refletem em toda a Constituição.
 
Outro princípio característico da Constituição suíça é o da boa- fé, que garante ao cidadão exigir que se cumpram acordos não escritos, além de ser um fator relevante em questões judiciais, onde o réu deve ser considerado inocente enquanto se declarar desta forma ou até que se possa provar o contrário. Este valor deve ser tratado com seriedade pelos suíços, já que agir com má- fé pode ser considerado um crime[vii].
 
Outros valores que compõem a Constituição Suíça são característicos das democracias atuais: dignidade humana; liberdade, que pode ser compreendida em várias óticas, desde o habeas corpus até o direito a escolha de ideologias e religião, além da liberdade de imprensa; e o direito a vida, que caracteriza a Suíça como um país terminantemente contra a pena de morte.
 
7. Aspectos Históricos
 
A tradição federalista da Suíça remonta a aproximadamente 700 anos de história. Dos 26 cantões que constituem a Suíça, os três mais antigos, Uri, Schwyz e Obwalden possuem um longo histórico de aliança e cooperação, e alguns dos documentos que selaram estes pactos são base para a Constituição Suíça moderna. Em 1291, estes três Estados se unem sob a Bundesbrief (Carta de Aliança) para combater os Habsburgos austríacos. Esta carta caracterizava o poder, independência e obrigações dos Cantões dentro da Waldstätte, nome que seria adotado para se referir à aliança. Em uma região onde os contratos eram e ainda são selados comumente na oralidade, valendo-se do princípio da boa- fé, o simples fato de ter havido a produção de um documento físico para registro desta união já revela a importância da autonomia federal para o Estado suíço. A Confederação passaria a estrategicamente adquirir novos Cantões até o início do século XIV, época em que a Waldstätte, agora contando com Lucerna, Zurique e Berna, derrotaria os exércitos de Habsburgos e seria vista como uma aliada pela Casa de Luxemburgo, que, durante boa parte do século XIV, governaria o Sacro Império Romano.
 
Porém, a Reforma Protestante chegou à Confederação por volta de 1520 e se espalhou rapidamente a partir de Zurique. No entanto, alguns Cantões permaneceram católicos, o que levou a Confederação a ser palco de guerras inter-cantonais, conhecidas como As Guerras de Kappel. Ainda assim, a população suíça cresceu de 800.000 para 1.1 milhões ao longo do século XVI, o que gerou diversos problemas na administração dos cantões. A dependência da Suíça em importações cresceu muito, já não havia mais possibilidade de expansão territorial e, ainda que os Cantões tentassem resolver os problemas decorrentes da falta de terras para subsistência da população, a tendência ao absolutismo se desenvolvia mais e mais, com os cantões outrora democráticos se transformando em oligarquias absolutistas.
 
A Suíça se manteve neutra durante a Guerra dos Trinta Anos, mas uma crise financeira agravada pelo sistema autoritário levou a uma guerra civil em 1653, seguida por guerras de cunho religioso em 1656 e 1712. Os anos seguintes se seguiram em relativa paz, até 1798, data em que a o Regime Revolucionário Francês conquistaria a Confederação, transformando-a no que se conhece por República Helvética, um território oficialmente francês, porém com uma constituição distinta, que nunca obteve apoio popular.
 
Este período, no entanto, durou apenas 5 anos. Em 1803, Napoleão restaura a maior parte da autonomia Suíça e reconhece 19 de seus Cantões como parte de uma Confederação.
 
Em 1815, o Congresso de Viena restabelece a independência Suíça e reconhece permanentemente a soberania dos Cantões, bem como sua neutralidade.
 
A partir deste período, dá-se início à construção de constituições na Suíça. A mais antiga constituição moderna é redigida em 1848 e conta com um artigo que permite que ela seja revista e completamente modificada se necessário, o que levou a quatro revisões, nas datas de: 1866, 1874, 1891 e 1999.
 
Conclusão
 
Apesar de sua estrutura parecer complexa, a Confederação Suíça é, portanto, um dos poucos Estados que conseguem manter-se fiéis às disposições previstas na Constituição. Costuma-se, inclusive, utilizá-la como exemplo de um país que conseguiu reunir povos diferentes sob uma mesma Constituição sem interferir na soberania destes. A Suíça é lembrada também no que diz respeito ao seu regime democrático semi-direto que, mesmo mantendo um sistema de representatividade, não exclui a opinião popular sobre decisões importantes.
 
Diz-se que, apesar das diferenças evidentes entre os cantões, os laços culturais helvéticos, que privilegiam valores importantes como o da boa-fé e o da livre iniciativa popular são capazes de manter a Confederação unida.

Escrito por Thiago Abreu, Igor Zaniboni, Talita Ferrari, Manuel Pfeuffer, Marina Morato e Erick Holowka para a disciplina de Princípios de Direito da Universidade Anhembi Morumbi ministrada pelo Professor Me.David Magalhães.






[i] SUÍÇA. Constituição (1999). Constituição da Confederação Suíça. Título III.

[ii] SUÍÇA. Constituição (1999). Constituição da Confederação Suíça. Título I, Artigo 3º.

[iii] SUÍÇA. Constituição (1999). Constituição da Confederação Suíça. Título V, Capítulo III, Secção 1ª.

[iv] SUÍÇA. Constituição (1999). Constituição da Confederação Suíça. Título V, Capítulo II, Secção 1ª.

[v] SUÍÇA. Constituição (1999). Constituição da Confederação Suíça. Título IV, Capítulo II.

[vi] SUÍÇA. Constituição (1999). Constituição da Confederação Suíça. Título II, Capítulo I, Artigo 15º.

[vii] SUÍÇA. Constituição (1999). Constituição da Confederação Suíça. Título II, Capítulo I, Artigo 9º.

Referências:

SWISSINFO.CH. Sistema Político Suíço. Disponível em <http://www.swissinfo.ch/por/sobre_a_suica/political_system/index.html?cid=844320>. Acesso em: 30 abr. 2011, 14:30:22.

SUÍÇA. Constituição (1999). Constituição da Confederação Suíça. Disponível em <http://www.admin.ch/org/polit/00083/index.html?lang=de&download=M3wBPgDB_8ull6Du36WenojQ1NTTjaXZnqWfVpzLhmfhnapmmc7Zi6rZnqCkkIN0f35,bKbXrZ6lhuDZz8mMps2gpKfo>. Acesso em: 28 abr. 2011, 02:10:27.

Fonte: site ENCLAVE.

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